A Reforma Tributária começa a ser julgada pelo STF
- Leonardo Gallotti Olinto
- há 1 dia
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Todos os motivos para se comemorar a vinda de uma nova ordem constitucional-tributária, a aclamada Reforma Tributária, já foram devidamente expostos, explorados e esquadrinhados.
É um caminho sem volta, não há dúvida.
A dúvida que assola todos aqueles que olham e vivem a realidade, com lucidez e honestidade, é o quão esburacado será esse caminho.
Há, inclusive, aqueles que já estão procurando os atalhos ou imaginando construir picadas para chegar ao destino, que será, ao fim e ao cabo, a partir de onde se cobrará uma das dualidades do IVA, o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).
A promessa de neutralidade fiscal
Recordemos, aqui, um dos motivos que justificaram os bumbos batidos e as fanfarras tocadas.
O cavalo de pau na tributação sobre o consumo traria (sim, no futuro do pretérito do indicativo) uma neutralidade fiscal.
O que é isso?
Num primeiro momento, confundiu-se o conceito com a rinha eterna dos ricos versus os pobres, para dizer que haveria uma maior carga tributária sobre aqueles, em detrimento destes.
Qual nada.
O princípio, em verdade, traduz a ideia de que a tributação não será mais o fator central para que (i) o produtor escolha onde vai produzir; e (ii) o consumidor escolha de quem vai comprar.
Como isso é feito?
Na visão dos formuladores da proposta inicial, simplesmente eliminando todo e qualquer benefício fiscal regional, sendo este o instrumento pelo qual as unidades federadas, especialmente as menos abastadas, utilizavam para atrair entes econômicos, criando empregos e gerando riqueza para a região.
O atrativo fiscal usado pelos Estados virou vilão e numa tacada magistral, a tal reforma acabaria com a chamada “guerra fiscal” e com a desigualdade de armas tributárias.
Comprar no Oiapoque ou no Chuí, passaria (insisto no tempo verbal), a ser indiferente do ponto de vista fiscal.
Exceções e tratamentos especiais na Emenda Constitucional 132
Ladeando-se a discussão sobre a demonização dos incentivos fiscais e assumindo que sejam maléficos, a ideia mirabolante somente se concretizaria se todos, absolutamente todos, os tipos de incentivo fossem simplesmente eliminados, inclusive a Zona Franca de Manaus, que não só não foi extinta como teve sua vida prorrogada.
Terminadas as discussões legislativas e promulgada a Emenda Constitucional 132, o que se tem (presente) é uma série de exceções e tratamentos especiais, que pura e simplesmente desmontam o festejado princípio da neutralidade.
Como é comum em todo processo legislativo, nossos representantes, do povo (Câmara) e dos Estados (Senado), dizem que a lei, em sentido amplo, que é gestada pelo Congresso Nacional é aquela que é possível, nem sempre sendo a ideal.
O popular “é o que tem para hoje”.
O que funciona, sabemos todos nós, são os lobbies de cada seguimento econômico, valendo a lei darwiniana da vitória sendo conferida aos mais fortes, ao topo da cadeia.
O caso dos agrotóxicos e as ações de inconstitucionalidade
O que foi gestado não foi o que se pariu, razão por tanto se conjugar, aqui, o futuro do pretérito. Não passou de uma ideia riscada no papel, ferida de morte na largada.
Os incentivos fiscais talvez, algum dia, sejam todos extintos. A ver. Mas as exceções tributárias jorraram aos borbotões e estão positivadas tanto na Emenda Constitucional, como reproduzidas na Lei Complementar 214.
Salvo mudanças de última hora, dado que falta uma série enorme de definições e até a undécima hora novidades podem aparecer, “é o que tem para hoje”.
Entre várias exceções, encontra-se a possibilidade de redução tributária na comercialização de agrotóxicos.
Devo registrar, para o bom entendimento da questão, que essa previsão já existia desde 1997, através de um Convênio entre os Estados, que foi objeto de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, proposta pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), sendo que houve várias pautas de julgamento, nenhuma delas conclusiva. Chegou-se a ter 6 votos favoráveis à manutenção do benefício fiscal, mas o julgamento foi zerado.
Pois bem, promulgada a Emenda Constitucional, o Partido Verde, ajuíza uma nova Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), repisando os argumentos do PSOL, mas aditando que seja declarada a inconstitucionalidade também da novíssima Emenda Constitucional.
Não devo entrar no mérito da questão, apenas dizendo que enxergo bons argumentos tanto naqueles que entendem ser necessário o tratamento diferenciado para os agrotóxicos, como os que o vilanizam, com espeque nas questões ambientais.
A constitucionalidade da Reforma Tributária e o papel do STF
O que devo ressaltar é que nem bem se terminou de comemorar a nova ordem constitucional, nem terminou a sua regulamentação, faltando uma vasta plêiade de normas que carecem de edição, em todos os níveis, é já se está a discutir a constitucionalidade da Emenda Constitucional.
Sim, uma Emenda Constitucional pode ser inconstitucional, bastando para tanto que vira as chamadas cláusulas pétreas, como origem no latim, de ser uma pedra fundamental, um alicerce sobre o qual todo o resto é construído.
Em poucos dias, o Supremo Tribunal Federal dará seu veredito sobre a matéria.
Se ainda não tendo começado a valer de verdade, já virem a ser declarados inconstitucionais pedaços da Reforma Tributária, cairá por terra outra promessa dos seus idealizadores, que é o aumento da segurança jurídica.
As regras começarão a mudar antes do apito inicial?
A ver.
Leonardo Gallotti Olinto, sócio do Daudt, Castro e Gallotti Olinto Advogados
